A professora drª. Isabelle Oliveira, diretora da Faculdade de Línguas Estrangeiras Aplicadas, da Universidade Sorbonne-Nouvelle Paris 3 – uma das mais conceituadas universidades do mundo, recentemente lançou um artigo na Internet em defesa do uso da Língua Portuguesa como grande Língua para as comunicações dos conceitos do mundo atual: entre os quais, o uso como Língua da ciência e da tecnologia. A seguir, o artigo:
Tendo em conta o papel estratégico da Língua Portuguesa e da diversidade linguística e cultural, é inegável que, alicerçados nos verdadeiros valores da Lusofonia, podemos fomentar a evolução do projeto político de um mundo mais justo, mais democrático e com maior respeito pelas diferenças.
Será coerente denunciar as tendências da economia e das finanças na era da mundialização e aceitar, resignadamente, o uso de uma única Língua da economia e das finanças? Será coerente denunciar a falta de democracia nas organizações internacionais e nas relações internacionais e, resignadamente, investigar, trabalhar e negociar em uma única Língua, que uns dominarão sempre mais do que outros?
Porque recusamos a segregação linguística e o darwinismo cultural, já não estamos dispostos a confiar a um globish – uma atrofia conceptual – a missão de transmitir toda a complexidade e diversidade do pensamento através de uma parca lista de 1.500 palavras.
Devemos tornar-nos insurretos linguísticos, cientes de que, a par de outras línguas, a Língua Portuguesa pode afirmar-se como uma Língua científica, técnica, económica, financeira, jurídica, e que tem vocação para ser uma Língua de transmissão de conhecimentos e de produção de material de referência, uma Língua profissionalizante, uma Língua da sociedade da informação, uma Língua de criação artística e cultural.
–– O português científico ––
Uma ação em prol do “português científico” só pode surtir algum efeito se for articulada e empreendida no âmbito de uma intervenção ponderada e resoluta a favor da projeção científica dos países lusófonos.
Ora, para esses países, tal projeção implica um domínio quádruplo, tanto a nível do ensino, quanto da investigação: o domínio da transmissão do saber e dos conhecimentos, o domínio da sua capacidade criadora, o domínio da avaliação dos resultados, o domínio da respectiva difusão. É no domínio destas diversas vertentes que importa analisar como, e em que medida, o uso do português pode e deve desempenhar o papel de “Língua científica”.
Talvez essa comunidade linguística venha a descobrir, progressivamente, o significado profundo que pode ter – tanto para a última quanto para toda a comunidade científica – a preservação e o desenvolvimento de um pensamento científico que é procurado, desenvolvido, manifestado e transmitido recorrendo frequentemente à Língua Portuguesa. Descobrirá, então, que não deve ceder à tentação da uniformização que, em ciência, se afigura inebriante.
Até em ciência é necessário proteger e fomentar as diversidades de pensamento, de concepções, de imaginário cultural e, nesse aspecto, nada as favorece tanto quanto a diversidade linguística.
A possibilidade de contar com uma manifestação, em Língua Portuguesa, da ciência viva, original, de qualidade, sustentada pelas reflexões e pelos trabalhos da comunidade lusófona, estimulada pelas suas próprias necessidades, mas aberta à comunidade mundial e com ela articulada, seria a forma mais segura de evitar determinados monopólios.
Uma utopia?… Um sonho inalcançável?… Juntamente com outras famílias linguísticas, a nossa missão consiste em mostrar as dificuldades inerentes a este repto, esclarecer os objetivos, revelar a magnitude dos meios necessários e aclarar as condições para a sua consecução. Face às suas dúvidas, estarão os nossos países e os nossos dirigentes disponíveis para superar o desafio?
OLIVEIRA, Isabelle.
Fonte: iOnline (Portugal).