PORTUGUÊS E ORALIDADE AFRICANA NO ARRANQUE DO III CONGRESSO DE LÍNGUA PORTUGUESA

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Especialistas defendem o bilinguismo ou multilinguismo como um fenómeno antigo, inevitável e natural Com o intuito de ajudar a estabelecer uma ponte entre o português e as línguas africanas, sobretudo entre a referida língua europeia e as peças literárias locais não escritas, o director geral do Instituto PIAGET de Benguela, Bonifácio Tchimboto, foi o primeiro […]

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Especialistas defendem o bilinguismo ou multilinguismo como um fenómeno antigo, inevitável e natural

Com o intuito de ajudar a estabelecer uma ponte entre o português e as línguas africanas, sobretudo entre a referida língua europeia e as peças literárias locais não escritas, o director geral do Instituto PIAGET de Benguela, Bonifácio Tchimboto, foi o primeiro a subir ao púlpito do auditório Roberto de Almeida da Universidade Jean Piaget, município de Viana, em Luanda, Quinta-feira, 18, na ocasião do III Congresso Internacional de Língua Portuguesa.

Bonifácio Tchimboto apresentou como pontos de abordagem premissas e generalidades, método de hermenêutica em provérbios, bem como ensaio e interpretação, tendo começado pelo retracto do inevitável bilinguismo, antes, durante e depois do período colonial.

“Nós somos ou estamos condenados a conviver e o convívio em língua pode chamar-se bilinguismo ou multilinguismo e eu queria aqui dizer que estas duas situações devem ser encaradas como um fenómeno inevitável e natural”, disse o docente universitário, chamando a atenção dos circunstantes para o facto de a convivência linguística não ser nova, uma vez que já precedia à época colonial, ao ponto de remeter o então reino do Congo, que tinha as suas fronteiras para lá de Angola, num autêntico cruzamento de línguas.

Neste contexto, o padre Bonifácio Tchimboto, enquadrava outros reinos grandes de África como são os casos do Bailundo e Monomotapa, que até tinham relações comerciais muito fortes entre si.

Por ser um fenómeno social natural, o prelector aconselhou a olhá-lo como um bilinguismo necessário, que, muitas vezes, se revelou como conflitual, quando, por motivos hegemónicos, uma língua se queria sobrepor a outras. Para assegurar as suas alegações, recorreu a tristes episódios da era colonial, que considerava os falares dos nativos de “língua de cão”.

“A língua do cão era uma designação resumida para as línguas africanas e a nós, quando ainda nos primeiros anos de escola, amarrava-se um madeiro pesado ao pescoço, em que estava escrito ´burro´, se, por engano, na instituição escolar, falássemos umbundu”, exemplificou o sacerdote, adiantando que o desafio correccional passava por se evitar falar línguas regionais.

De acordo com o padre, a cara pesada resultante desta situação criou na cabeça de muitos, até aos dias de hoje, o receio de resistir ao bilinguismo.

“Temos zonas de Angola em que foi retirada da antroponímia toda referência às línguas africanas”, informou o palestrante, questionando-se como era possível em África os nomes serem de origem portuguesa, russa ou inglesa e não podiam tomar nada de África.

Preocupado em mostrar como o fanatismo na antroponímia estrangeira podia causar repetições desnecessárias, o professor Bonifácio contou uma história, segundo a qual tinha conhecido um cidadão que se “Nós somos ou estamos condenados a conviver e o convívio em língua pode chamar-se bilinguismo ou multilinguismo e eu queria aqui dizer que estas duas situações devem ser encaradas como um fenómeno inevitável e natural” chamava José da Silva Matos Kosengue, de quem revelou, imediatamente, que só possuía um nome, porque Silva, Matos e Kosengue tinha a ver mesmo com mata, o que remetia o indivíduo a transportar um só nome em três vocábulos.

Outra controvérsia trazida à mesa pelo prelector foi a do facto de a literatura advir de um termo que significava, taxativamente, letra, quando, ao mesmo tempo, se falava de literatura oral, sem letra, ao que o prelado esclareceu, rapidamente, argumentando que a literatura era um campo amplo, tendo acrescentado que cada género literário partia de particular situação social e histórica.

Administração e ensino reféns

Ao proceder a abertura do simpósio que convoca especialistas para reflectirem em torno das problemáticas da língua portuguesa, a ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva, reconheceu a língua portuguesa como um meio privilegiado da administração e do ensino. No que toca às dificuldades que ainda se assistem para o domínio dos fundamentos do referido veículo linguístico por parte da população de Angola, a ministra apontou a camada juvenil, onde disse pontuarem milhares de estudantes inseridos nos mais diversos níveis de ensino, como sendo a faixa etária que precisa de uma imperiosa intervenção, de modo a contribuir para a melhoria do seu ensino e da sua orientação.

Rosa Cruz e Silva aproveitou a ocasião para partilhar com os presentes algumas curiosidades da história que explicavam e confirmavam a importância da língua portuguesa nas relações entre os povos. Sem poupar pormenores, a ministra fez uma alusão ao passado, referenciando o ano de 1482, em que as elites conguesas, a partir da corte dos soberanos do Congo, se manifestaram prontas a aprender e utilizar a língua portuguesa em nome do grau de ligações políticas e económicas.

“Curiosamente, uns anos após desse início, o soberano do Congo, NZinga NKuvu, preocupou-se com a instalação de escolas para os meninos do seu reino aprenderem a ler e a escrever, tendo solicitado, para o efeito, a vinda de professores e missionários que se encarregariam desta importante tarefa”, reforçou a ministra da Cultura, assegurando que a missão prosseguiu, de forma mais obstinada, por NZinga MVemba ou Dom Afonso I, que fez multiplicar as escolas, ao ponto de enviar os jovens para conventos em Lisboa.

Instrumento de Libertação

Depois de dar as boas vindas aos participantes do III Congresso Internacional de Língua Portuguesa, o magnifico reitor da Universidade Jean Piaget, Pedro Domingos Peterson, afirmou que os líderes de movimentos de libertação nacional, nomeadamente, Amílcar Cabral, Samora Machel e Agostinho Neto, consideraram a língua portuguesa como instrumento de libertação e de unidade nacional.

“Por sua vez, a Constituição da República de Angola confere à língua portuguesa o estatuto de língua nacional e oficial, salvaguardando, porém, dada à realidade etnolinguística do nosso país, a diversidade linguística.

À semelhança da ministra Rosa Cruz e Silva, o magnifico reitor da UNIPIAGET reconheceu que, em Angola se assiste a um grande insucesso na aprendizagem da língua portuguesa, que considerou como causa de 50 por cento das reprovações no ensino primário, seguido pelo fracasso na disciplina de matemática.

Em nome da área de matemática da universidade anfitriã do congresso, Ângelo Silva disse que era recomendável os professores assistirem e participarem na palestra, já que se tratava do principal meio que usavam para transmitir conhecimentos. Além disso, Ângelo Silva manifestou as suas expectativas no sentido de perceber sobre a diversidade existente e o que é que a língua portuguesa havia bebido das línguas locais.

O congresso que decorreu entre os dias 18 e 20 de Setembro, teve como temas O ensino da língua portuguesa em Angola, contribuição da literatura no desenvolvimento da língua portuguesa, pistas essenciais para o português de Angola e outros conexos, que se enquadraram no lema “Unidade na diversidade”.

Fonte: O País.ao –  Por Alberto Bambi.
Tags :
angola,língua portuguesa,pluralidade linguística

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