
José Saramago e Jorge Amado combinam um almoço no Estoril, próximo a Lisboa. Mais adiante, tentam se encontrar em Paris, mas a agenda de compromissos e palestras provoca um infeliz desencontro. Mesmo assim, Saramago deixa uma pequena encomenda para Jorge no saguão do hotel. Outro dia, o autor de Capitães de areia sofre um enfarte. O amigo português fica comovidamente preocupado. Lá pelas tantas, Saramago descobre que o Banco no qual Jorge depositava todo seu dinheiro faliu. Elegantemente, sugere que pode ajudar, caso necessário.
E o tempo inteiro os dois escritores confabulam sobre prêmios, especialmente sobre o Nobel, esse “demônio” que nunca chegava para a língua portuguesa. Dos dois, Saramago é o mais enfático: “De geografia, Estocolmo sabe tudo, menos onde ficam Brasil e Portugal…”. Era 1995 e o autor de Ensaio sobre a cegueira ainda vociferaria por três anos antes de ser agraciado pela Academia Sueca, em 1998, com o Nobel de Literatura. A troca de correspondência entre Saramago e Amado revela como uma amizade profunda ligou dois dos maiores nomes da literatura de língua portuguesa.
Publicada pela Companhia das Letras com o título de Com o mar por meio – Uma amizade em cartas, o volume compilado por Pilar del Río, jornalista e viúva do português, e Paloma Amado, filha do baiano, transborda carinho. Talvez por isso tenha sido editado tão rapidamente. Pilar já havia enviado boa parte do acervo de Saramago à fundação que leva o nome do escritor, mas guardou as cartas trocadas com Amado. Quando recebeu o pedido de Paloma, já tinha praticamente tudo organizado.